Com o encanto de uma criança descobri o “Ma”.
Ma 間 é uma palavra formada pelo sol (日) no meio de um portal (門). É múltipla, mutante, se transforma em contato com diferentes contextos e realidades. Um espaço-entre.
Dentro da cultura japonesa o Ma é uma expressão de um modo de viver que não requer conceitos, significados ou palavras. Percepção além da lógica.
Uma de suas origens remete ao Budismo e a estética da impermanência, interdependência, incompletude e circulariedade. Minami Hiroshi (Minami 1983 in OKANO 2012), psicólogo, pesquisador de artes plásticas tradicionais, artes performáticas populares e teorias da comunicação, salienta que o fato de se apreciar o elemento residual na arte, isto é, o vestígio que se situa no limiar entre a forma e não forma, ou entre o som e o silêncio, vem do Budismo.
O Ma chegou ao ocidente através da exposição do arquiteto japonês Arata Isozaki “Ma: Espace- Temps du Japon” em 1978 na cidade de Paris.
O objetivo era apresentar a noção de espaço-tempo japonês através do conceito de Ma, no qual mais do que um espaço intervalar seria uma sobreposição, movimento, indeterminação. Para isso a exposição era uma experiência multissensorial que convidava o visitante a experimentar o Ma através de 7 ambientes temáticos que representavam um aspecto diferente de Ma.
Dentre tantas possibilidades, e isso por si só já é o Ma, uma das que mais me chamou a atenção foi o tempo contido no espaço do próprio caminhar e sua relação com o espaço-entre.
Ao chegar a um templo budista há uma separação do exterior com o interior. Um espaço-entre. Há um caminho a ser percorrido do portal até o edifício do templo propriamente dito. Muito além do todo, há o aqui e agora, o caminhar. Há a natureza e muitas vezes pedras, pontes, fontes e escadas no caminho. Há pausas. Há silêncio. Há vazio. Aos poucos, desligando do mundo exterior, o passo fica mais lento, a respiração lenta, profunda, os sons dos pássaros são mais nítidos. O caminho não é mais o mesmo. A pessoa não é a mesma. As pedras, o céu, a água a árvore… Coexistência, interdependência, incompletude, efemeridade, Vazio. Ma.
“Forma é exatamente vazio, vazio é exatamente forma”. (Sutra do Coração)
Texto elaborado por Andreza Albuquerque. Praticante Daissen Ji. Escola Soto Zen.
Fontes:
OKANO, Michiko. Ma: entre-espaço da arte e comunicação no Japão. São Paulo: Annablume;
Imagens:
Fontes: instagram @mosteiro_zen_morro_da_vargem