O monge Shou Duan era muito diligente, mas não tinha senso de humor.
Praticava o Zen de forma rígida e moralista e, sempre sisudo, era incapaz de se guiar pela alegria. Um dia seu mestre Yang-ki perguntou:
“Quem foi teu professor anterior?”
“O monge Chaling Yu”, respondeu o outro.
“Ouvi dizer que ele obteve o satori quando escorregou de uma ponte e caiu na água, e até mesmo chegou a escrever um poema sobre isso, não foi assim?”
“Sim,” replicou Shou Duan, “e eu ainda me lembro do poema”:
“Tenho uma pérola brilhante,
Que por muito tempo esteve obscurecida pelo pó;
Agora o pó se foi,
E o brilho voltou,
Iluminando os rios e as colinas.”
Ouvindo isso, o mestre Yang-ki caiu na gargalhada, rindo sem parar. O monge Shou Duan ficou pasmo. Não entendeu o porquê de tanta alegria.
Naquela noite, assustado, foi incapaz de dormir, pensando no que poderia ter sido tão engraçado naquilo tudo.
No dia seguinte foi à presença do mestre e lhe perguntou:
“Mestre, por que riste tanto ao ouvir o poema que recitei ontem? Não entendo o que pode ser tão engraçado!”
“Ontem um palhaço esteve aqui, apresentando-se numa pantomima. Tu te lembras disso?”
“Sim, lembro-me.”
“Pois há um aspecto nele que é completamente superior ao teu espírito.”
Intrigado, o monge replicou: “E o que um palhaço possui de mais profundo do que eu?”
“Ele gosta que as pessoas riam e sejam alegres, mas tu temes o riso das pessoas…”
Ouvindo isso, o monge atingiu o esclarecimento.
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Comentário:
Engana-se aquele que imagina o Dharma destituído de leveza. Engana-se aquele que destrói em si a liberdade do riso na pretensão de demonstrar determinação.
Sem o dom da alegria, viveremos minguados em uma prisão feita de inseguranças, disfarçada de orgulho moral.
A prática exige disciplina, força de vontade, concentração. Mas o caminho que nos conduz à compreensão destas virtudes não passa pela carência de contentamento.
Encontre a virtude do riso em seu coração. Passo a passo, saiba reconhecer em si mesmo a dignidade da alegria consciente, viva, compassiva.
Mas cuidado! O Zen não celebra a tolice, o caos, o desrespeito mútuo. A prática precisa ser leve, livre, suave – mas sem perder o sentido correto da celebração.
Sorria, não esconda o seu riso. Não se perca na triste senda da repressão. A vida é tão curta, e ao mesmo tempo tão plena. Mesmo diante dos problemas e dificuldades, encontre tempo para olhar as estrelas, a beleza das flores, a candura das nuvens; e rir alto pela simples maravilha de estar vivo.
Texto de Monge Kōmyō, Sensei da comunidade Daissen Ji. Escola Soto Zen.
Foto: Michel Osmont – Young Tibetan Monks – Jeunes Moines Tibetain