A Arte da Cozinha Zen de Monja Jeong Kwan

 

Não existe diferença entre cozinhar e seguir o caminho de Buda”. Essa é uma das frases ditas pela monja sul coreana Jeong Kwan, que exprimem bem o espírito de sua culinária.

Jeong Kwan nasceu em Yeongju, uma província ao norte da Coréia do Sul. Cresceu em uma região rural, onde aprendeu com a mãe e o pai a plantar e utilizar os ingredientes disponíveis, aproveitando a época e sazonalidade de cada um. Aos 17 anos, após a morte repentina de sua mãe, a monja Jeong, então uma adolescente em profundo sofrimento, saiu de casa em busca de algo que aliviasse a dor causada pela perda da mãe. Segundo ela, prometeu a si mesma que jamais teria filhos para que eles não viessem a sofrer tamanha dor. Foi então que, sem carregar nada em suas mãos, nem mesmo roupas, chegou ao Mosteiro Baegyangsa, mosteiro do Budismo Seon (Budismo Zen Coreano), da Ordem Jogye, onde se tornou monja e vive até hoje. A história da cozinha da Monja Jeong está intimamente ligada aos ensinamentos do Zen. Jeong Kwan traz a essência do Budismo para a criação de seus pratos. Como ela mesma afirma, a cozinha é uma forma de meditação.

Tudo se inicia na plantação, no cultivo de seu jardim / horta. Lá, as plantas crescem livres, junto aos insetos, em perfeita harmonia com o ambiente. Não há intervenção para que se alinhem, ou cresçam belas, não se descarta as de aparência menos apetitosas ou que tenham sido devoradas em parte pelas larvas; tudo isso é a manifestação da plenitude da existência e do papel de cada um. Ali, sol, terra, ar e água interagem, fazendo o maravilhoso trabalho de transformar uma semente em uma planta que também se transformará em um maravilhoso alimento.

A estética do Zen também é claramente percebida na montagem de seus pratos. Simples, minimalistas, belos, harmoniosos, repletos de detalhes que exigem do observador um pouco mais de atenção, calma e abertura para o novo, que, muitas vezes, não é tão novo assim. Monja Jeong utiliza em sua maravilhosa cozinha, técnicas muito antigas como a fermentação, amplamente utilizada no Oriente. Os ingredientes são colocados em recipientes com água e sal, e o tempo se encarrega de fazer o trabalho, mais uma vez transformando uma coisa em outra, um sabor em outro, uma forma em outra, uma textura em outra. Assim, a vida vai mostrando, por meio da comida, a maravilha dos ensinamentos de Buda: a transformação incessante.  Se soubermos parar e apreciar o trabalho da natureza em sua magnitude, como a Monja Jeong Kwan faz, talvez, venhamos a experimentar novas sensações para nosso paladar.

Chá de flor de lótus

Talvez, por todas essas características, a culinária da Monja Jeong Kwan possa ser classificada como uma obra de arte. O ato de preparar alimentos é, muitas vezes, uma construção artística em seu mais profundo sentido. Desde pensar a obra (o prato em si), o modo (técnica) de prepará-lo, a combinação de sabores, cores, texturas; o que ele expressa em sua concepção e como o resultado final interage com quem irá dele se alimentar. E a sua comida alimenta a energia espiritual, além de alimentar o corpo. Assim como a arte.

Comida de templo preparada por Jewong Kwan

Para conhecer um pouco do maravilhoso trabalho desta monja, assista ao primeiro episódio da terceira temporada da série Chef’s Table, disponível na Netflix, é um ótimo começo.

 

Texto de Ana Maria Rangel. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.

 

 

 

Fonte:

 http://themidweekvegetarian.com/Temple-Food-with-Jeong-Kwan

https://hashitag.com.br/chefs-table-terceira-temporada/

https://www.scmp.com/magazines/post-magazine/food-drink/article/3139467/korean-temple-food-and-how-make-it-netflix-star

Documentário Chef’s Table. Episódio Jeong Kwan. Disponível na Netflix.

 

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