Ikebana é a arte japonesa de arranjo floral, também conhecido como “caminho das flores”. Nessa arte procura-se demonstrar o equilíbrio existente no universo unindo céu (shin), o homem (Soe) e a terra (Tai ou Hikae) dentro de uma mesma composição. A arte chegou ao Japão no século VI, trazida por missionários chineses que criavam os arranjos como uma oferenda ao Buda, utilizando em sua composição ramos e galhos naturais, flores, frutos e plantas secas. A Associação de Ikebana do Brasil, situada no bairro da Liberdade em São Paulo, é um dos locais onde essa arte tradicional japonesa é ensinada e praticada, apoiada nos princípios da concentração na experiência do momento presente, contemplação e aprendizado com a natureza.
Existem diversos estilos de Ikebana, cada um segue um conjunto de regras, técnicas e cuidados em sua elaboração, possibilitando uma variedade de arranjos que vão desde os mais simples e delicados a outros complexos e trabalhosos. Porém, todos buscam traduzir por meio das cores, formas e detalhes a maneira como o ser humano enxerga sua vida, sua interação com o mundo e com o divino, o universo, seu olhar para a natureza e tudo ao seu redor. No processo de feitura as folhas são fixadas em um “kenzan”, uma base com cerdas pontiagudas dentro de um recipiente cheio de água. O arranjo é feito para durar apenas 24 horas, pois a virtude está justamente no processo, no caminho percorrido para chegar até aquele resultado, e não no produto final em si.
Os estilos de ikebana
Rikka: o mais antigo, trata-se de arranjos com devoção aos deuses e simboliza a beleza do paraíso. O Rikka possui nove posições, que foram criadas pelos monges budistas, são estas:
- Shin: montanha espiritual
- Uke: recebendo
- Hikae: esperando
- Sho shin: cachoeira
- Soe: ramo de apoio
- Nagashi: fluxo
- Mikoshi: ignorar
- Faça: corpo
- Mae oki: corpo frontal
Ikebana Style Rikka Shimputai Ikenobo, Artesanato por Thai Mai Van
Seika: este estilo traz mais liberdade em arranjar as flores. Nascido da junção de duas outras formas consideradas mais rígidas, o Rikka e o Nageire, que permitem que as flores descansem livres no vaso. No final do século XVIII a interação de ambas deu origem ao Seika que significa, literalmente, flores frescas. No Seika, três posições foram mantidas: shin, soe e uke, criando um triangulo desigual.
Classical shōka arrangement from the Sōka Hyakki
Moribana: este estilo de Ikebana evoluiu como uma maneira de criar uma qualidade escultural mais tridimensional com o uso de plantas naturais.
Moribana water reflecting style
Ikebana contemporâneo: Segue sendo fundamental o estilo dos arranjos de flores clássicos, mas a visão e gosto modernos levaram ao uso de uma variedade de materiais que não eram usados antes.
Ikebana sogetsu free style
Quais flores, ramos e galhos usar?
Em geral os arranjos são feitos com três ramos ou caules principais. O primário representa o homem. O secundário, que é um pouco menor, representa o céu. E o ornamental (único com flores) representa a terra. Busque por galhos e ramos longos lembrando sempre que o primeiro ramo é o maior de todos! Quanto as flores, procure por espécies que tenham simbolismos importantes como por exemplo: lírio da paz.
Como escolher os vasos?
Os vasos de Ikebana em sua maioria são baixos e redondos, uma arte delicada e minimalista, em tons sombrios como cinza, preto ou branco. Caso opte por vaso mais fino e alto deve lembrar de usar ramos altos de forma que componha o modelo escolhido.
Como fazer?
- Prepare sua mesa de trabalho;
- Coloque o Kenzan dentro do vaso;
- Prenda seu ramo ornamental no Kenzan com base na inclinação do seu ombro esquerdo: ele representa o céu;
- Posicione o ramo primário ligeiramente na frente em ângulo de 45 graus;
- Prenda um ramo menor à frente num ângulo de 75 graus para representar a terra;
- Agora enfeite o Ikebana com flores e folhas menores para esconder o Kenzan no vaso. Essas flores são chamadas de Jushi. Tenha certeza de que são mais curtos que os principais e que mantém a água visível pois esta é uma característica importante.
Onde colocar os vasos?
Os arranjos devem ser vistos de frente então é recomendável que não uso como centro de mesa. Escolha um local iluminado e em destaque. No Japão arranjos Ikebana são colocados em locais como sala de estar, hall de entrada, com boa visibilidade e destaque.
As dez virtudes do Ikebana
De acordo com o renomado artista e estudioso de Ikebana, Dr. Sosho Shimbo (2007), a arte do arranjo de flores possui 10 virtudes sublimes em ressonância com a prática do Zen. São elas:
- Não discriminação
A natureza não discrimina; nem deveria o praticante de Ikebana. Ao contemplar a capacidade da natureza de apenas existir, aprendemos a interagir com todas as pessoas e todas as coisas igualmente. Historicamente, o Ikebana proporcionou aos artistas de classe baixa oportunidades de se misturarem com os aristocratas e até mesmo com os imperadores.
- Não-Eu
Quando ficamos frente a frente com as flores, ficamos livres de quaisquer preocupações e podemos limpar nossas mentes. Em zazen, uma das coisas que se busca é estabelecer uma mente clara, livre do Eu tagarela. Com a ajuda dos elementos naturais em seus arranjos, muitos alunos Ikebana passam a experimentar esse estado de espírito quase sem perceber.
- Fazer amigos sem trocar palavras
Diante das flores, sentimos uma alegria além das palavras. Quando compartilhamos essa alegria com outras pessoas, podemos formar um vínculo que transcende a linguagem. Por meio de nossos arranjos, podemos nos comunicar em um nível mais profundo com as pessoas, independentemente do idioma que falem.
- Aprender com as plantas
Ikebana nos ajuda a aprender sobre muitos tipos de flores e árvores com bem pouco esforço. Aprendemos seus nomes e nos sintonizamos com a natureza de cada planta e seu ciclo. Em particular, aprendemos como é curta a vida de uma flor. Isso, por sua vez, permite perceber o quão curta é a nossa própria vida. Esperamos riqueza, fama ou sucesso em nossas curtas vidas. Esses apegos e desejos são a causa de nossa infelicidade. Por meio da beleza simples de uma flor, contentes com a natureza de sua curta vida, podemos vir a apreciar a transitoriedade da vida em vez de ficar deprimidos por ela, e aceitar nosso lugar no universo. Este é um dos passos mais importantes para o crescimento espiritual e é fácil perceber a conexão com os ensinamentos do Zen.
- Alcançar respeito
Por meio da atenção ao momento presente, da não discriminação e trabalhando para estabelecer uma mente não egoica, o Ikebana nos ajuda a desenvolver e melhorar nosso caráter. Como resultado, muitas pessoas respeitam os artistas Ikebana. Se você visitar o Japão, verá como os professores Ikebana são respeitados em suas comunidades.
- A experiência com os aromas
Na prática do Ikebana podemos estar sempre rodeados pelos aromas agradáveis das flores. Como qualquer aromaterapeuta lhe dirá, os aromas realmente afetam nosso humor e sentimentos. Mesmo quando nos sentimos um pouco deprimidos, o perfume das flores sempre nos anima.
- Afasta-se de pensamentos prejudiciais
Às vezes podemos ter pensamentos maus ou negativos. Quando nos deparamos com flores, no entanto, esses pensamentos desaparecem instantaneamente. Ikebana pode ajudar a manter nossas mentes calmas – um verdadeiro bônus no mundo de hoje.
- Mente pacífica
À medida que cultivamos uma mente calma e em paz por meio do Ikebana, podemos nos nutrir e viver com mais qualidade. As estatísticas mostram que até hoje os professores Ikebana são um dos grupos de ocupação que vivem mais tempo no Japão, um país com algumas das pessoas mais velhas do mundo.
- Mente sublime
Mantendo uma mente pacífica de manhã a noite, podemos desenvolver uma compreensão da elegância do mundo natural. Podemos nutrir nossa gentileza e chegar mais perto de nos sentirmos um com o universo.
- Experimentar profundamente o sentimento religioso
Buscamos cada vez mais experiências nas quais possamos nos sentir próximos de Buda, dos Deuses ou do Espírito Divino, dependendo de sua filosofia pessoal. Ikebana é uma forma de nos ajudar a fazer contato com os elementos da natureza e as leis do universo.
As dez virtudes do Ikebana nos lembram que, caso tenhamos a chance de aprender essa arte tradicional, é importante estarmos cientes dos aspectos terapêuticos e espirituais que os japoneses valorizam há séculos. Encontre paz em seus arranjos de flores.
Pesquisa: Martha Benites e Juliana Aires. Texto de Juliana Aires e Guilherme Soares. Praticantes na Daissen Ji. Escola Soto Zen.
Referências:
Shimbo, Shoso. The Ten Virtues of Ikebana. Zen and the Way of Flower. Living Now, 2007.
https://www.vivadecora.com.br/revista/ikebana/amp/
https://www.significados.com.br/ikebana/amp/
https://www.portaloriente-se.com/a-essencia-do-ikebana-expressa-sentimentos-desejos-e-espiritualidade/
