Entrevista e Fotografias com Monge Chimon

Passagens da Exposição Fotográfica no Centro Zen de João Pessoa

 

Durante o mês de dezembro de 2021, a comunidade zen-budista de João Pessoa promoveu, começando no dia 8, dia do Rohatsu, a comemoração do despertar de Sidarta Gautama, uma exposição fotográfica em benefício da finalização do novo centro, que teve sua estreia pública na mesma época.

Para isto, a exposição contou com as obras de Monge Chimon, Nadja Andrade e Álvaro Jardel de Oliveira. Na edição passada, contamos com um artigo expositivo das fotografias do Álvaro Jardel e uma entrevista sobre sua experiência. Desta vez, apresentaremos as de Monge Chimon, monge da Soto Zen, praticante do Daissen Ji.

A seguir, acompanhe a entrevista conosco e confira as lindas fotos da exposição.

Todas as fotografias expostas neste artigo estão à venda, todo valor arrecadado será direcionado para as obras e a manutenção do centro e das atividades do Dharma em João Pessoa.

Para mais informações, por favor, entre em contato com o centro por meio do seu perfil no Instagram: @zenjoaopessoa.

 

A fotografia se relaciona com a prática budista? Como?

Monge Chimon: A fotografia pode sim relacionar-se com a prática budista, partindo do princípio de que habitualmente temos certo automatismo quando olhamos as coisas que nos cercam, muitas vezes acreditando que tudo já nos foi dado como experiência perceptiva daquele momento. Na verdade, não é bem assim, estamos diante apenas das lentes que colocamos a partir de nossa cultura, conceitualizações e até mesmo do julgamento que fazemos de que estamos frente a verdadeira natureza das coisas. Por outro lado, a fotografia permiti-nos revelar aspectos ou perspectivas das coisas, ainda não percebidas, o que acertadamente nos faz duvidar se a percepção que temos da “realidade” captada e a própria compreensão que temos delas, merece ou não ser sustentada.

Como tem uma radical dependência com o olhar e as vivências que temos, uma fotografia principalmente se for antiga, não pode ser vista duas vezes e da mesma forma. Isso porque até mesmo a nossa memória se modifica e se reconfigura de novos sentimentos ou emoções oferecidas por nosso cotidiano. Se repararmos bem, sem os filtros de nossas conceitualizações, não temos mais que tinta e papel, mas que ainda assim, as fotos são vistas como um simulacro a expressar uma composição daquele momento junto com todas as suas condicionantes.

Então, uma fotografia (principalmente se nova) pode ser comparada a uma bela tela mental, onde as percepções ainda não produziram marcas profundas em nossa memória, em que se podem fixar certas características sobre o que vemos, do que pensamos ou das emoções que frequentemente lhes atribuímos. Se tivermos uma mente bem treinada em zazen (meditação), a fotografia pode nos trazer o frescor das coisas como elas ainda são, sem as interferências confusas das emoções e dos padrões estéticos que socialmente partilhamos. Elas ainda, podem servir de referência para compreendermos quer no momento de sua captura ou da visualização, a qualidade da paisagem mental que temos a cada momento; até porque o que visualizamos também constroem a nossa mente e o conteúdo do que chamamos nosso eu. Já uma mente treinada em não se fixar nas características de uma fotografia, terá sempre nesse campo uma oportunidade imensa de ver como as construímos e de como elas são intrinsecamente livres de quaisquer características que lhes atribuímos, tal qual como fazemos com o próprio eu. É sobre esse prisma que considero as relações entre a fotografia e as práticas budistas.

 

Pensando no resultado da exposição, como foi, para os senhores, participar deste processo de criação e seleção das fotografias?

Monge Chimon: Tive muita facilidade, junto ao Álvaro, para selecionar essas fotos, ele foi muito cordial, gentil demais comigo. E também nós tivemos a contribuição de Nadja que participou com três fotos e o Álvaro com oito, eu participei com 11. Então assim, no final das contas, acho que houve um acordo muito tranquilo entre a gente para fazer esta exposição.

De fato, eu tentei o máximo possível não pensar muito sobre as fotos que eu iria colocar. Claro, que eu já tinha algumas ideias antes por já ter uma noção do acervo que eu tenho. Mas eu preferi não pensar muito para poder exatamente ser inédito tanto para as pessoas quanto para mim mesmo, e para não ficar muito preso ao resultado disso, né? Para não ficar muito na expectativa de um resultado disso. A ideia foi ser o máximo espontâneo possível, assim como de certa forma a prática do Zen nos proporciona, ser uma experiência única, sem muito julgamento, sem muita especulação, né? Sem muitas expectativas. Então assim, foi bem tranquilo. Funcionou bem, o Monge Taishin deu uma ajuda incrível também, para isso. E assim, eu senti que a comunidade deu uma boa resposta para o que foi possível ser feito.

 

Qual foi o impulso de escolher uma exposição fotográfica para a reabertura do centro?

Monge Chimon: Na verdade, assim, eu fui na ideia do monge Taishin. Devo responsabilizá-lo por tudo isso, porque na verdade, quando planejamos, ou pensamos que iríamos fazer uma reabertura, a ideia inicial foi dele mesmo, logo quando ele recebeu as primeiras fotos que a Nadja doou. A partir dali, acho que o monge Taishin já pensou, clicou com essa ideia de fazermos uma exposição. Então eu só apenas embarquei, porque assim, confio muito na condição que ele tem dado ultimamente as coisas e me senti muito à vontade. E achei que era uma ideia boa, porque precisávamos ter um evento, não somente uma inauguração. Precisávamos ter um evento, criar uma oportunidade, né? E essa oportunidade foi excelente.

Eu já tinha as fotos e o Álvaro também, então assim, acho que ocorreu de forma muito espontânea, mas a ideia é totalmente originária do monge Taishin. Eu o agradeço, porque nunca pensei que iria fazer uma exposição fotográfica. Tenho feito já algumas fotos, trabalho inclusive com imagem, porque sou cinegrafista dentro de uma TV local aqui já há mais ou menos 22 anos, mas nunca tinha trabalhado com fotografia. Comecei a trabalhar com fotografia depois de um curso que realizei, mas nunca pensei que iria fazer uma exposição fotográfica. Acho que isso até me quebrou, de certa forma, vamos dizer assim, esse gelo que eu tinha em relação a ideia de fazer qualquer exposição das minhas fotos.

Eu tinha um certo receio, mas acredito que depois dessa iniciativa desmistificou-se determinados medos que eu tinha em relação a isso. O medo é porque, vou te confessar, eu não me vejo fotógrafo, né? Não me vejo fotógrafo. Ainda me vejo cinegrafista, 22 anos acho que já me deu uma noção de que eu tenho uma habilidade como cinegrafista, mas nunca como fotógrafo. Então, estou devendo essa ao monge Taishin porque de uma certa forma ele me coloca dentro de um lugar que para mim é inédito. E que assim, eu vejo que pode surgir outras oportunidades interessantes com a fotografia, e criar novas imagens ainda bastante inéditas e boas, boas dentro do meu medíocre, vamos dizer assim, julgamento, né? Então, a todo caso, eu agradeço demais ao monge Taishin por ter sido este impulso primeiro para gente realizar essa exposição.

 

Quais relatos sobre a recepção da exposição e a relação com a prática Zen os senhores poderiam destacar?

Monge Chimon; O trabalho da exposição, acho que teve uma imersão muito forte da sangha local. Para não ser injusto com todos, mas a comunidade, não vou citar nenhum nome especificamente, mas a comunidade como um todo foi bem receptiva a ideia. Nós conseguimos, de fato, mobilizar a maioria dos praticantes. Acredito que o resultado foi bom, inclusive as pessoas ficaram muito satisfeitas como as coisas foram conduzidas e gostaram das fotos. Teve uma recepção boa da comunidade, alguns praticantes inclusive fizeram plantão para receber as pessoas que quiseram participar e ver a exposição, eu fiz este trabalho de recepção, monge Taishin também, nós partilhamos junto com a comunidade todo este momento da produção da exposição, e como ela fazia parte da reabertura do centro, eu senti que a comunidade foi muito decisiva nisso, para o resultado que nós tivemos.

Não vendemos todos os quadros, ainda estamos vendendo alguns, as pessoas que ainda quiserem comprar os quadros, ainda estão à venda. Se as pessoas gostarem das fotos, podemos replicar, emoldurar e fazer o envio. Foi muito bom, a comunidade se envolveu bem com a exposição. Isso é fundamental, quando a comunidade está envolvida isso é um bom resultado em si mesmo. Ter a motivação da sangha em estar realizando um projeto junto, isso já é um ganho fantástico. E teve inclusive praticantes que fizeram doações para que pudéssemos fazer parte da reforma do prédio e poder finalizar.

 

Entrevista realizada por Matheus Coutinho. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.

 

Pin It on Pinterest

Share This