Na Trilha das Emoções

Respiração Consciente

De acordo com o dicionário, respirar é o ato de inspirar e expirar o ar nos pulmões. A respiração é uma das funções automáticas do corpo, embora tenhamos parcial controle sobre ela ao falar, cantar ou mesmo prender o fôlego voluntariamente.

Normalmente quando nos sentimos estressados, ansiosos ou nervosos nossa resposta corporal tende a ser respirar de maneira rápida e curta, o que pode levar a sensações de tontura e confusão.

Voltando nosso olhar para o Budismo, quando nos sentamos em meditação, uma das instruções antes de iniciarmos o zazen é respirar profundamente e mantermos essa respiração durante toda a prática. Com as mãos em mudra cósmico concentramos nossa respiração em um ponto mais ou menos três dedos abaixo do umbigo, o centro do nosso corpo, conhecido em japonês como “hara”. Caso nos dispersemos em pensamentos, devemos voltar a nossa atenção para a respiração de forma a nos ancorarmos no momento presente.

Uma forma de interpretarmos essa relação com a respiração é a interdependência que nos une a tudo. Ao inspirar estamos em contato com nossa grande mãe Terra e com todos os seres e ao expirarmos abrimos nosso corpo como um todo e entregamos a eles nosso universo inteiro. A cada inspiração e expiração somos um.

Respirar é fundamental para viver, mas muito além disso, quando praticada com atenção, de maneira consciente, nos possibilita apreciar a preciosidade de estarmos vivos neste exato momento.

As crianças, em especial, necessitam de ajuda para perceberem seus sentimentos, pensamentos, sensações, bem como para auxiliá-las a mudar o foco, a focar em algo específico, a desacelerar a mente, relaxar o corpo e cultivar presença. Podemos nos perguntar: Como isso é possível? Umas das respostas certamente poderia ser: através da respiração consciente!

Nas palavras do mestre Zen Thich Nhat Hanh: “Sentimentos vão e vêm como nuvens no céu. A respiração consciente é minha âncora”.

Aqui, novamente, de forma carinhosa, cuidadosa e lúdica podemos plantar pequenas sementes nas nossas crianças lhes demonstrando na nossa prática o que seria essa respiração profunda, essa respiração consciente.

A respiração profunda é aquela feita a partir do diafragma, ou seja, em que nossa “barriga” enche, vai para frente e esvazia encolhendo. Feita de forma lenta, inspirando, enchendo e expirando, esvaziando o máximo possível, trazemos nossa consciência, nosso foco para a respiração e podemos começar a perceber como nossa mente é agitada e fica continuamente saltando de um pensamento para outro.

Respire. Façamos uma pequena pausa de nossas mentes discursivas. Um momento de silêncio, um intervalo das narrações e identidades que tanto nos esforçamos para manter.  Respirando profundamente e conscientemente estamos no momento presente, no fluxo e em toda riqueza que se apresenta neste instante, o único que existe. Seja mar.

Ao trazer esses conceitos para o universo infantil podemos encontrar diversas formas de introduzir a respiração consciente.

Uma sugestão seria iniciar fazendo uma dobradura de papel, ou origami, uma antiga técnica de aprendizagem, que envolve a concentração, além de outras habilidades. Neste caso a dobradura seria a de um barquinho. Crianças pequenas podem nos auxiliar, já as maiorzinhas certamente conseguirão fazer com a supervisão de um adulto.

Com o barquinho pronto, podemos conversar um pouco com as crianças sobre o mar, sobre onde ele começa e onde ele termina, sobre o céu azul que se confunde com o mar, sobre as ondas que vem e vão e se misturam com a areia. Sobre a maresia, seu cheiro, seu gosto… Como tudo se torna um.

Somos o barco, mas em essência nós somos o mar! E para aprendermos a navegar vamos colocar nosso barquinho nessas águas! Para isso, a criança pode se deitar e colocamos o barco na sua barriga abaixo do umbigo. Peça para ela encher a barriga de ar (inspirando) movimentando o barco para cima e depois soltar todo o ar (expirando) fazendo com que nosso barquinho vá para baixo. Mas cuidado! Se mexer muito rápido o barco poderá virar!

Vamos navegar nosso barquinho de forma serena, profunda e lentamente, prestando atenção em todas as ondas e como nosso barco sobe e desce. Se achar necessário ou quiser, pode deitar com a criança e demonstrar com sua barriga o movimento.

Não crie expectativas quanto à participação das crianças, especialmente as menores. Provavelmente elas irão querer explorar o barco, irão se levantar e retornar (ou não) e está tudo bem! Precisamos respeitar o tempo das crianças, pois elas muitas vezes necessitam de repetição das conversas e dos movimentos que nos remetem às ondas do mar para então participar.

Quando a criança já estiver mais habituada com o barquinho, ou mesmo em algum momento mais calma, no banho ou antes de dormir, podemos aproveitar a oportunidade para introduzir uma repetição com variação adicionando, por exemplo, uma canção!

Imagine que estamos no meio do mar, que somos barco e oceano (aqui inspire e expire profundamente para a criança perceber a sua respiração e possivelmente imitá-la). Consegue ouvir as ondas? Ouça:

Canta o mar, onda que vai,

 Canta o mar, onda que vem.

Sob o luar você é mar,

A te encantar canta a sereia: Aaa, aaa, aaa, aaa.

Aqui também já deixamos algumas pistas para as crianças sobre os encantamentos da sereia, sobre as ilusões da vida, que poderá ser retomado em outra oportunidade.

Por fim, mantenha seu barquinho à vista para lembrar de respirar de forma profunda e consciente, rememore as ondas que sobem e descem, inspire e expire de forma profunda várias vezes ao longo do dia, afinal somos os modelos de nossas crianças que certamente irão nos imitar em algum momento.

Aos poucos passe essa visão de forma que a criança consiga executar os movimentos de respiração em pé ou sentada. E lembre-se que podemos voltar para o mar sempre que precisarmos, seja para fazermos uma pausa, para acalmar a mente, para cultivarmos presença, afinal de contas somos o próprio mar!

 

Texto, arte e vídeo por Andreza Albuquerque. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.

 

Referências:

Siegel, Daniel J.;Bryson, Tina Payne. O Cérebro da Criança. 12 Estratégias Revolucionárias para Nutrir a Mente em Desenvolvimento do seu filho e ajudar sua família a prosperar.Respirar | Michaelis On-line

https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/respirar

Zen Wisdom – How Breathing Brings Us To The Present – Balance (buddhagroove.com)

The Mindfulness of Breathing | The Buddhist Centre

Take Three Conscious Breaths – Lion’s Roar (lionsroar.com)

Breathing Lessons – Lion’s Roar (lionsroar.com)

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