Origens e História do Zen

 

Buda nasceu em Kipilavastu; Iluminado em Magadha; Ensinou em Varanasi; Entrou no Nirvana em Kusinagara – (Cântico Sotozen para a Hora da Refeição).

Zen japonês, com sua ênfase sobre a prática do Zazen, estudo do Koan e a realização do Satori, tem suas origens na China. Aqui, os primeiros mestres Zen, ensinaram e os primeiros mosteiros reconhecidamente Zen foram fundados. Entretanto, as raízes mais profundas do Zen encontram-se na índia, onde o Sidarta Gautama nasceu, alcançou a Iluminação e fundou a religião budista. A história da sua vida desperta um interesse mais do que histórico, já que, para os seguidores do Zen, ele é o modelo supremo de alguém que seguiu o Caminho até o fim e realizou a Iluminação perfeita. Buda (palavra sânscrita que significa O Desperto) não é uma figura abstrata do passado, mas um homem com o qual um mestre Zen pode sentir um relacionamento pessoal na consciência de suas lutas compartilhadas. O seguidor do Zen acredita que cada um de nós tem o potencial para alcançar o despertar total e que o caminho de Buda não está reservado para uns poucos escolhidos, mas definitivamente aberto para todos.

Buda nasceu no século sexto a.C, a noroeste da índia. Quando nasceu, seu pai, Suddhodana, consultou um astrólogo, o qual previu que o jovem Sidharta cresceria para ser um herói e conquistaria o mundo, ou seria um grande sábio. Suddhodana, evidentemente, preferiu a primeira opção e tomou providências para que seu filho fosse criado com todas as virtudes dos reis e guerreiros da época, protegendo‑o, tanto quanto possível, de qualquer coisa que pudesse levá‑lo a questionar o significado da vida. De início, os objetivos de Suddhodana foram bem‑sucedidos, e Sidharta tornou‑se um jovem forte e feliz. Casou‑se, e sua mulher deu à luz um menino. Entretanto, embora não percebesse claramente por que, começou a sentir‑se inquieto, achando que a sua vida não lhe trazia nenhuma satisfação. Decidiu fugir secretamente do palácio e aventurar‑se entre os súditos de seu pai. Pela primeira vez na vida, deparou com as realidades: doença, velhice e morte e, como resultado dessa experiência, tornou‑se cada vez mais angustiado, compreendendo que, por maior que fosse a proteção, o conforto e o luxo que o pai proporcionava não podiam impedir que ele, nem ninguém, lutasse pela vida.

Refletindo sobre o problema e em busca de uma resposta, decidiu tornar‑se mendigo errante. Naquela época, este era o caminho para os que queriam entender a morte e o sofrimento da humanidade. Assim, Sidharta renunciou à riqueza, ao poder e à família, partindo em busca da verdade. Ele tinha quase trinta anos, estava na plenitude da vida e era muito determinado. Estava abandonando tudo por um futuro totalmente incerto. Como era praxe, não possuía nada, dormia ao relento e obtinha comida, esmolando.

Procurou vários mestres, aprendendo tudo o que eles sabiam, mas continuava sem solucionar suas dúvidas a respeito do significado da vida. Na sua determinação para equacionar este problema, sujeitou‑se a todas as formas de rigorosa austeridade, ganhando a reputação de asceta. Um pequeno círculo de seguidores reuniu‑se em torno dele. Juntos, jejuavam, expunham‑se aos rigores do calor e do frio, e submetiam‑se a mortificações físicas. Depois de cinco anos desta vida, Sidharta estava quase morto de fome e exaustão, e ainda não tinha conseguido solucionar sua dúvida.

Finalmente, concluiu que o significado da vida não tinha de ser descoberto por meio de um ascetismo extremo e, assim, abandonou esta prática. Não devemos desprezar o significado desta sua atitude. Com efeito, ele chegou à conclusão de que os cinco ou seis anos em que se sujeitou, voluntariamente, a mais incrível dureza (e reconquistou algum status pessoal, em consequência disso) foram uma completa perda de tempo. Da mesma forma como quando decidiu abandonar o palácio de Suddhodana deve ter sido necessária uma grande coragem e autoconfiança para chegar a este reconhecimento. E isto também comprova a força de sua dúvida pessoal a respeito do significado da vida, bem como sua fé e determinação para solucioná-la.

Pela primeira vez, em muitos anos, comeu uma refeição decente. O resto do grupo, que o tinha como mestre partiu revoltado. Profundamente frustrado por seu próprio fracasso, Sidharta, de repente, lembrou‑se de uma época de sua infância em que, sentado debaixo de uma árvore, no jardim do palácio, espontaneamente experimentara um estado de perfeita harmonia e paz com a vida. Com determinação renovada, sentou‑se debaixo de uma árvore e resolveu que só se levantaria quando sua dúvida a respeito da vida estivesse totalmente satisfeita.

O dia cedeu lugar à noite, e a noite trouxe a aurora. Então, de acordo com a versão existente no Zen, a estrela da manhã despontou no horizonte e, vendo‑a, Sidharta, subitamente, compreendeu que nunca haviam faltado respostas para suas dúvidas. Vida e morte eram apenas fenômenos passageiros, no palco do não‑nascido, o qual não era outro senão ele próprio. “ʺIsto é um milagre!”ʺ exclamou. “ʺTodos os seres vivos são intrinsecamente iluminados, quanto ao significado da vida e da morte, são perfeitamente dotados de sabedoria e da compaixão dos Despertos, mas, dados seus pensamentos ilusórios, não podem percebê‑lo.”ʺ Compreendendo esta verdade, sua dúvida foi resolvida e Sidharta Gautama tornou‑se Buda Shakyamuni.

A verdade descoberta era tão simples e sutil, que ele teve dúvidas de que alguém fosse capaz de entender. Entretanto, ao meditar, deu‑se conta de que deveria haver, pelo menos, algumas pessoas prontas para sensibilizarem‑se com seus ensinamentos e, assim, iniciou uma vida dedicada ao ensino que deveria se prolongar por quase quarenta anos, e cujas repercussões são sentidas até nossos dias.

Texto elaborado pela Coluna de História e Sociedade.

 

Fonte:

O livro de ouro do zen – David Scott e Tony Doubleday; tradução de Maria Alda Xavier Leôncio – Rio de Janeiro – RJ: Ediouro, 4ª ed. 2001.

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