A Ficção Científica e Suas Previsões Sobre o Futuro do Planeta

 

Carros voadores, milhares de placas captando energia solar e uma cidade cinza, repleta de poeira. Nenhum organismo a vista, não há verde, nem o amarelo das flores, nem cor alguma. É nesse cenário distópico que se inicia o filme Blade Runner 2049, que me desencadeou uma série de reflexões acerca do futuro. Este filme faz parte de uma saga, portanto é importante primeiramente contextualizar a trama. A saga se inicia em Los Angeles, no ano de 2019, sendo representada como uma cidade poluída, cheia de luz neon, grandes outdoors digitais voadores e muitas características que mostram que nossa espécie acabou com as condições climáticas equilibradas da Terra. Ao mesmo tempo, com todo desenvolvimento da tecnologia, seres replicantes (androides), são criados para explorar outros planetas. Replicantes são seres bem semelhantes aos humanos, só que melhores nos quesitos de agilidade, força e inteligência.

Neste momento a saga contempla um ponto importante que é a efemeridade da vida, uma vez que os replicantes nesta época podiam viver por apenas 4 anos, e apesar de serem androides, eles tinham o medo de morrer. Este instinto de sobrevivência, algo inerente aos seres vivos, fez com que eles tentassem trilhar um caminho em busca de sua longevidade. Após um motim, estes androides mais antigos foram considerados ilegais na Terra e começa uma caça a eles por meio dos blade runners, que são autorizados a executar qualquer replicante.

A saga se desenrola e um caçador se apaixona por uma replicante e foge com ela. Ao decorrer dos filmes, ocorre um blecaute causado por um pulso eletromagnético e assim, o suprimento de alimentos acaba e aquele ambiente fica em uma situação ainda pior. O último filme mostra que foram desenvolvidos alimentos geneticamente modificados, e melhorias na engenharia genética, e assim, com o personagem Niander Wallace, cientista e criador da fábrica de replicantes (Wallace Corporation), a proibição destes seres é revogada, e ele desenvolve seres “perfeitos” (Nexus 9). Grandes mudanças climáticas são observadas no ano de 2049 como o aumento no nível do mar, e assim foi criado um grande paredão para proteger a bacia de Los Angeles. O local se apresenta mais inabitável do que nunca e cheio de pobreza e doenças, e os humanos restantes que não conseguiram partir para outros planetas ficaram para trás.

Logo no início do último filme, um homem usando um avantajado traje de proteção, manipula “insetos” dentro de um tanque cheio de água de cor verde escura. Ele é um fazendeiro que produz proteínas, que no caso, são estes “insetos”. O ambiente mostra-se totalmente devastado, como um deserto com terra e muito vento contendo demasiada poeira. Há uma cena em que o protagonista, que é um blade runner, encontra uma flor de cor amarela e a admira pois naquele cenário, tudo apresenta uma origem sintética e ele demonstra uma admiração frente aquele belo organismo colorido. Em uma de suas caçadas ele descobre que possivelmente o fruto dos dois personagens que fugiram pode estar vivo, e a polícia ordena que ele o execute. O fruto destes dois replicantes é chamado no filme de um “milagre”, afinal, um grande problema até então, era tornar estes androides férteis.

A admiração para com uma flor, e o desenvolvimento de um bebê sendo considerado um “milagre” me trouxeram muita reflexão: posso ver estes “milagres” todos os dias ao abrir minha janela, ao comer, andar, beber um copo d’agua, mas será que eu vejo mesmo? E a verdade é que depende da minha prática: quando está em dia, é natural eu me sentir parte do todo, estar realmente presente e admirar, num universo onde não cabem palavras, as folhas, os insetos, o sol e as nuvens passando. É quando consigo por alguns segundos esquecer de mim, que sinto o todo.

Tratando a natureza como algo secundário e separado, como seriam nossas vidas se ela não existisse mais? Diante de todos os acontecimentos decorrentes das devastações ambientais provenientes da ação de nossa espécie, não é difícil imaginar que um dia teremos uma condição na qual estaremos em um total desequilíbrio, eliminando todas as espécies de outros organismos possíveis neste planeta. O uso e devastação dos recursos de forma desmedida pode refletir em um cenário que prefiro nem imaginar.

Diversos outros filmes do gênero de ficção cientificam trazem essa visão catastrófica sobre o fim do mundo, como Elysium (2013) e Interstellar (2014). Estas obras apresentam em comum o link entre nosso modo de vida e o esgotamento de recursos que resulta na necessidade do desenvolvimento da tecnologia para substituir o que recebíamos do meio ambiente de forma “gratuita” e natural. Não há muita saída além da artificialidade de todas as coisas existentes neste filme e, portanto, a conclusão que chego é que vendo dessa forma, a natureza como algo separado, fica difícil entender qual o nosso papel nisso tudo. Chamo aqui de natureza todos os seres animados e inanimados que compõe essa rede complexa de relações. No budismo fica claro o entendimento da interdependência, e ao ver este filme é possível notar que com pensamento de que estamos separados do todo, sinto que acabamos por nos distanciar cada vez mais de nossa verdadeira natureza e não entendemos que somos parte dela, estamos incluídos e podemos mudar as coisas.

 

Texto de Mariana Belchor. Doutora em Biologia e Professora de Fisiologia. Praticante na Daissen Ji. Escola Soto Zen.

 

Referencias:

https://www.bbc.com/portuguese/vert-fut-61811736

http://revistaalceu.com.puc-rio.br/index.php/alceu/article/view/200/201

https://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-134393/?page=3

https://www.daissen.org.br/quem-sou-eu/

 

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